domingo, 27 de dezembro de 2009

Sentei-me. Li...li...li... e... não vieste.
Não respondeste à minha mensagem... que se calhar nem leste... que provavelmente nem recebeste.
E eu fiquei ali... na minha companhia e do meu livro.
E não senti o vazio que pensei que sentiria.
Tive só pena, gostava de te ter visto à minha frente... com o ar arrogante que usas como defesa, quando sabemos os dois quem és.
Tinha vontade de voltar a olhar para os teus olhos, de quem pede socorro a cada minutos... mas... depois fogem com medo.
Tinha vontade de rever as tuas mãos... O teu sorriso.
De te rever a ti.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Um só

Somos um só e seremos sempre.
O nosso sangue, o nosso cheiro, o nosso toque misturou-se durante meses para a vida.
O nosso sorriso e gargalhadas caminharão eternamente de mãos juntas.

Somos um só e seremos sempre.
Com estar diferentes, paralelos, divergentes...
Com uma alma em três.

Somos um só e seremos sempre.
Mesmo quando fechamos os olhos... Mesmo quando fecharmos os olhos.
Mesmo quando serramos os punhos e deixamos sair um lamento... Mesmo quando pousamos as armas e nos detemos.

Somos um só e seremos sempre.
Apesar da dor... e além da dor.
Apesar da saudade... e além da saudade.
Apesar das partilhas e dos risos... e além das partilhas e dos risos.
Cúmplices. Sempre.
Somo um só e seremos sempre.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Sempre

Estarás sempre aqui. Mesmo depois de partires não te consigo libertar na totalidade. Não me consigo libertar. Apesar de te saber por aí... noutras vidas.
Caminhas ao meu lado... mesmo nos dias em que não me lembro de ti... ou em que não me lembro que me lembrei de ti.
Tenho colado à pele o calor com que me abraçavas e continuo a reconhecer o teu cheiro. Lembro o teu sorriso e o que riamos juntos, mesmo quando eram as lágrimas que estavam por trás. No final tu recuperaste as lágrimas e as minhas secaram. Que ironia!!!
E afinal parace que o "sempre" sempre existe.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Caminhos

Caminha com passo pequeno e disfarçadamente arrastado.
Pele escura, côr de chocolate, e bastante amarfanhada.
Cabelo tingido de um estranho ruivo e ripado... curto... com pequena flôr branca... murcha.
Roupa descaída.
Olhos baços e fixos num qualquer ponto imperceptível.
Caminha pelos caminhos do centro de Lisboa... sem se ver... sem ver... sem ser vista.
Uma pluma negra... errante... que vagueia sem destino... sem um rumo... sem caminhos.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O tempo... no Natal

O tempo passa e com ele sucessivos natais... e mais natais...
E com o passar o tempo e dos tempos mais vultos negros se arrastam de loja em loja... uns buscam a prenda perfeita... outros simplesmente uma prenda... até se transformarem em sombras.
Sombras daquilo que foram outrora... sombras de natais em que já foram felizes e em que o Menino Jesus deixava um brinquedo no sapatinho.
Agora? O sapato não chega para tanta inutilidade, que se recebe com indiferença. E é com essa mesma indiferença que se devolve o gesto... que outrora já foi de carinho.
Os sonhos já não são amassados em casa... são comprados.
Perdeu-se o ritual... perdeu-se a ilusão... perderam-se os sonhos nas sombras e nas sobras dos natais passados.

Fábrica das Letras - Natal

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Tempo

O tempo passa e com ele sucessivos outonos, invernos... seguidos de primaveras e verões.
O tempo vai envelhecendo comigo, e com ele as intempestivas mudanças de vida... de formas... de fórmulas... de serenidades.
No entanto, framentos dos passados permenecem. Inalteráveis. Escondidos num canto de um quarto, no fundo de uma gaveta, dentro de um bolso.
Convivem ao meu lado sem eu dar por eles... a não ser de vez em quando...
Pedaços de um passado passado que estão cá sempre em memórias mais ou menos esbatidas
Estilhaços de um passado muito presente que teimam em picar-me a cada sorriso, a cada passo na história das histórias... que se faz de simples recordações.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

E porque nem tudo tem de doer...

E porque nem tudo tem de doer, hoje saí para a rua com o meu sorriso mais genuíno.
Afinal é Natal!
E que importa se não posso comprar todos os brinquedos que eles querem.. se podemos fazer juntos bolinhos de côco?
E o que interessa que as minhas botas já estejam rotas... se estamos juntos a fazer a nossa árvore de Natal?
E sim, gosto do Natal e quero-o todos os anos... a chegar de mansinho na noite de dia 24 e a instalar-se até ao ano que vem no dia 25. É das poucas coisas que me está garantida... O Natal... Sempre... Todos os anos entre 24 e 25 de Dezembro.
Por isso aproveito-o até ao limite. E se possível, todos os anos, vejo a "Música no Coração" como se fosse a primeira vez.
E porque nem tudo tem que doer, abraço os natais passados e vou construindo os do futuro.

Para Fábrica das Letras - Natal

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Para chegar onde?

Corro, corro, corro, corro...e chego onde? Ali? Aqui? Cá e lá?
E volto a correr... não sei parar... não consigo.
E ignoro o cançaso que me sobe pelas pernas e me apanha o corpo todo.
Rio-me dele, na cara dele... Mas é um cansaço que não desiste.
E eu persisto em correr.
E curo as nódoas negras com o peso de outras que vão surgindo.
Uma esquina de uma mesa... um carrinho cheio de compras... um tropeção... dois... ombreiras das portas que ganham subitamente vida.
Uma desilusão... duas... um amigo que desaparece... um amor que não volta e se perde nos escombros da vida.
Corro, corro, corro corro... para no fim, bem lá no fim, chegar a mim!!!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Curta metragem...a preto e branco

Deu-lhe a mão e tentou puxá-lo para cima... consigo.
O contrapeso estatelou-a naquela chão de vidros e gravilha.
Mas insistia em lhe dar a mão... sempre, porque vinha de sempre... e apesar do sangue que lhe escorria dos cortes e se misturava com as sua lágrimas secas e salgadas.
Tentou mover-se durante eternos momentos... e só conseguiu mais cortes... mais arranhões.
Quando os eternos momentos terminaram no tempo e no espaço... ergueu-se... finalmente.
Curou as feridas, os arranhõe e até as dores.
Rebuscou lá bem no fundo e resgatou um sorriso... que a espaços se vai abrindo no Mundo.
Mas manteve para sempre a sua pequena mão na mão dele.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Que me apetece...

Que me apetece... hummm... tanta coisa boa...
Passear na praia descalça, enquanto os miúdos correm à minha volta... à minha frente.
Sentar-me na areia molhada a refazer castelos.
Abrir a cesta do pic-nic e... simplesmente abrir a cesta do pic-nic.
Enrolar-me num cadeirão, com uma manta quentinha em volta dos ombros... a ler... a ouvir o falar do mar... e conversar com ele. E a beber um chocolate quente.
Sentir o teu cheiro... saber-te a respirar ao meu lado.
Dar-te a mão horas a fio... em silêncio... como o fizémos tantas vezes... como o sonhámos tantas outras...
As nossas lágrimas secas enrolam-se umas nas outras e escorregam-me sem preocupações pela cara.
Desaprendi tudo.

Ping...

ping...ping...ping...
Reviro-me na cama sem conseguir voltar a adormecer.
Culpo a torneira... ping... que não não consigo fazer parar de pingar.
Culpo o barulho do motor do frigorífico que também acordou.
Culpo a corrente de ar que abana a porta que bate baixinho em pancadas secas.
ping... ping...ping...
A cabeça vazia contorce-se em pensamentos agri-doces.
E tenho saudades do que é era suposto ter sido... e ficou suspenso.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Orgulho ferido em troco de paz.
Orgulho engolido em troco de serenidade.
O peito crivado de espinhos que teimam em contorcer-se na pele... na carne... e avançam direitos ao coração... que gela.
Lágrimas secas escorrem pela face... teimosamente.
O andar acelera... entorpece... escorrega...volta a acelerar. Sem nunca sair de onde está.
Porque está preso a um chão... a este chão. ´
Uma húmidade entranha-se pelas solas dos pés e escorrega corpo acima... até à pontinha dos dedos. Que se enternecem com o calor que tenta trespassar a pele... e não consegue... não consegue... não consegue.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Receita para Principes

Ingredientes:
1 sapo gordo e reluzente
2 doses de inteligência
1 dose de perspicácia
Muito bom sentido de humor
Algum estilo
Saber falar português
Gosto pela leitura
2 doses de paciência
1 dose de tolerância
1 sorriso lindo e genuino
1 par de mãos lindas

Mistura-se tudo, polvilha-se com muito saber falar português e gosto pela leitura, e dá-se um beijo no final.
Quem sabe... Talvez resulte...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Em mim

Ando, ando, ando... às voltas... em circulos. Sem sair do lugar.
Primeiro tenho um pé preso... depois os outro. As mãos dormentes. Branca... muito branca cambaleio até ao pontão. Em tropções abruptos e descoordenados.
E enrolo-me em mim. Talvez uns dois dias.
E renasço vezes sem conta... sempre ao primeiro amanhecer.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Wallyyyy!!!!!!

Um saco de berlindes... um pião... um livro... tudo dentro do bolso da camisa.
A praia deserta... gaivotas em terra, tempestade no mar.
"Wallyyyyy!!!!!!!!! Wallyyyyyyyy!!!"... um grito rasgado com o mar como pano de fundo.
Cheiro a sal, areia nos pés... onde estão os peúgos?... e a manta?...
E o pufe num canto eterniza a espera. A espera de um olhar parado, de uma naúsea sentida. A espera de um rasgão, de uma gota de sangue que escorre e se mistura nas lágrimas.
"Wallyyyy!!!"... susurra.

domingo, 18 de outubro de 2009

Lisboa

Olha só para ti!!! Olha só para mim!!!
Consegues olhar para dentro de nós??? De ti??? De mim???
Ainda consegues???
Ainda consegues ver alguma coisa???
Eu??? Um farrapo a cada lembrança... a cada sonho destruído... a cada esperança roubada.
Uma sombra do que fui... por opção... por escolha própria.
Eu??? Uma mar de luta... de revolta... de brusquidão...
Uma sombra do que sou a vaguear por esta Lisboa que partilhamos.
O que resta de um nós... Lisboa.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Onde?

A saudade no futuro, de um passado... num presente entorpecido e enublado... vivido entre trambolhões e sorrisos.
Joelhos esfolados, pernas carregadas com nódoas negras... um história em cada uma... uma vida... uma vivência.
A saudade no presente, do passado... num futuro idealizado... a dois... a quatro mãos... sozinha... afinal sempre comigo.
Unhas partidas e cravadas na terra húmida... e escorregadia. Cabelo molhado pela força das lágrimas.
A saudade no passado, do futuro... num presente feliz. Uma saudade que acabará por ficar por lá... num passado preenchido a espaços... completo aqui e ali.
E aquele vazio tão cheio sempre de volta.

"Às vezes, no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado, juntando o antes, o agora e o depois
Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho!
Não sou nem quero ser o seu dono

É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?
Quando a gente gosta

É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?
Quando a gente gosta

É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?"
(Sozinho, Caetano Veloso)

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Improbilidades prováveis

Um epaço vazio...
Uma linha em branco... muitas...
Uma inexistência sentida ao limite das gotas de suor.
E um sorriso arrancado à pedrada das entranhas de um ser.
Um vento que sopra em tom de brisa, suavizando os dias cinzentos.
A poeira que se levanta e roça na pele sem autorização prévia.
O cheiro a terra na palma das mãos e as unhas sujas de lama.
Um sol a queimar a pela ressequida pelo sal do mar... enquanto as ondas batem suavemente nas rochas para não acordar o Mundo.
Uma nuvem a passear de mão dada com outra... em bicos de pés.
Quero estar lagarta e vou guardá-la numa caixa... também ela verde... verde clara!!!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Nunca

Separam-nos simples minutos... eternos segundos. Estaremos para sempre separados sem assim o termos desejado. A vida afastou-nos, mesmo quando sentados no mesmo sofá e a dividir a mesma manta, mantendo-nos ligados para sempre numa infinita ironia!!! A vida a fazer troça de nós...
Encostada a ti consegui sonhar. Mas... para quê? Para me esborrachar no chão de pedra no minuto seguinte. Vezes sem conta. E me levantar outras tantas vezes sem conta, com a boca cheia de sangue e a tentar ir ao fundo das minhas entranhas buscar a vontade de voltar a acreditar sempre?
Vale sempre a pena... dizem que sim... dizem que estamos vivos... irra! Estou cansada de viver de muletas na alma...
Até que se deixa de acreditar. Apesar de se voltar a sorrir.
Marcas profundas... feridas que nunca vão fechar. Nunca.

sábado, 26 de setembro de 2009

Espinhos ao sol

Os espinhos cravaram-se-lhe primeiro numa mão... acabando por se alastrar ao resto do corpo durante toda uma vida sempre de luta, sempre com a armadura vestida. Excepção para um dia, um único dia em que viu uma nesga de sol e resolveu vivê-lo. Sem dúvidas que o viveu na sua plenitude. Respirou sem filtros, olhou sem máscaras, correu sem atilhos nas pernas, abraçou sem limites, beijou e beijou e tornou a beijar até ficar sem fôlego. No final do dia, quando confiou, quando acreditou que poderia guardar o fato de guerra... deu o seu último suspiro depois de ser apunhalada... de frente, no peito.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Vou morrer...

Vou morrer com uma pétala branca, de rosa branca, cravada no peito. Vou morrer com um ligeiro suspiro que solto, numa performance ensaiada durante anos... e repetida milhares de vezes até ter a certeza de que naquele dia correrá de forma perfeira. Porque não haverá encore...
Sei muitas coisas, sei muitas coisas que vão comigo e muitas coisas que por cá ficarão. Só não sei se sei as mesmas coisas que tu, só não sei se soube aprender contigo. Porque não tenho a ousadia de querer ensinar.
Quero egoisticamente aprender, beber dos outros e de ti. Lamber até à ultima gota o Mundo. Este Mundo de lama e sangue, de suor e dor, de alguns sorrisos... forçados... onde me mantenho erguida à força de pulso.
Procuro incessantemente um pouco de almas genuínas... e sempre que estou a um ponto de apanhar uma e a agarrar... ela escorrega-me por entre os dedos... e começa tudo outra vez.
Vou morrer num suspiro breve de uma felicidade cansada.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Lembro-me...

Lembro-me tão bem... "vou estender a roupa. quem quer vir?". E lá ia eu de bola debaixo do braço, enquanto a minha irmã ficava em casa a brincar aos crescidos.
E eram momentos mágicos aqueles... Eu ia buscar as molas e as pequenas peças de roupa, que ela estendia. "uma camisola minha. Mais uma camisola minha. Umas calças gannndessss". Corria por entre a roupa e chutava a bola com força... "gooollloooooooo!".
Lembro-me de me aninhar no colo dela e lhe chamar "minha rainha", enquanto ela me apertava e me chamava "paixão".
Lembro-me de correr todas as manhãs para a cama dela, a que eu chamava "o teu mimo", para me aninhar nela, que estava sempre quentinha, e voltar a adormecer... ou conversar até a fome fazer doer o estômago.
Lembro-me de estender o guardanapo com bolinhos imaginários, feitos pela avó... e ela os comer deliciada.
Lembro-me tanto e de tanta coisa... Lembro-me de aprender a andar de patins com ela e do dia em que me tirou as rodinhas da bicicleta e me ensinou a andar.
Lembro-me quando me ia buscar à escola e me ouvia a contar o meu dia.
Lembro-me que tinha uma canção só para mim e ma cantava ao ouvido, quando me pegava ao colo como a um principe, e me contava as histórias do pirata dentolas e dos senhores do wresttling mesmo antes do adormecer.
"boa noite minha rainha!"

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Quem perdeu...

Os dados voltaram a rolar em cima da mesma toalha de plástico com flores garridas de sempre. Onde sempre foi perdendo.
Uma mesa redonda onde há anos perde a paz, a calma, a serenidade... ou terão só sido alguns meses? Perdeu a conta ao tempo, que lhe trocou as voltas... naquela sala escura e com cheiro a tabaco... onde semana após semana esborratou o baton e o rimel cuidadosa e meticulosamente posto para o momento.
Os dados rolaram mais um vez... e mais uma vez pôs em cima da mesa de madeira da avó o sorriso, o acreditar, a alma... que tantas vez perdeu e recuperou, entre uma passa num cigarro amarfanhado e um golo de amêndoa amarga.
E fechou os olhos e esperou...desta vez não houve lágrimas a atraiçoarem-na.
Os dados pararam... finalmente.
Já não suporta o barulho dos dados a girar que se agiganta ensudecedouramente à frente dos seus olhos. Por isso os fecha... numa tentativa patética de não ouvir aquele barulho que a fere.
Os dados pararam... mas aquele silêncio era ainda mais ensurdecedor que o girar daqueles dois cubos gastos pelos ventos dos anos.
Teve medo, tanto medo de abrir os olhos e ter de entregar a serenidade outra vez... abriu os olhos ligeiramente e suspirou... por agora a sernidade continuava na sua mão.
E sente que poderá... talvez... recuperar o acreditar que continua do lado de lá.


"A noite acabou
O jogo acabou
Para mim aqui
Quando acordar
Já te esqueci
O filme acabou
O drama acabou
Acabou-se a dor
Tu sempre foste um mau actor
Fizeste de herói no papel principal
Mas representaste e mentiste tão mal
Quem perdeu foste tu só tu e nunca eu
Afinal hoje o papel principal é meu e só meu"
(Adelaide Ferreira - Papel Principal)

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Cigarro

Acorda cinco segundos exactos antes do despertador do telefone querer tocar. Faz um sorriso porque mais uma manhã em que lhe trocou as voltas e o desligou sem o deixar acordá-la em sobressalto. Levanta-se com o cabelo em desalinho e a boca empastada, a saber mal. Toma os comprimidos da manhã e enrola um cigarro, enquanto bebe um copo de leite com chocolate.
Acende o cigarro com o mesmo fósforo que usa para acender o fogão onde aquece a água com que se lava.
Toma um banho apressado enquanto um refogado que começou de forma despreocupada quase queima; entorna a carne lá para dentro e vai-se vestir. O cigarro seguinte é acendido no bico do fogão e é partilhado com uma fatia de pão com manteiga e uma festa no gato.
O cheiro a tabaco e a cebola mistura-se-lhe nas mãos... pontas dos dedos amarelecidas... unhas queimadas.
Uma hora depois sai de casa.
Volta ao fim do dia depois de mais uma rotina cumprida.
E ali fica... cigarro colado entre os dedos...
E ali fica a equilibrar-se na ponta da vida... de uma vida.
O cheiro a cebola e tabaco ainda não saiu das mãos.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

S.O.S.

Um guilty pleasure?
Um ponto final? Mais um? Uma virgula? Um ponto e virgula?
A vida regida pela gramática. Na ponta de um lápis de carvão que se esborrata ao sabor de uma lágrima teimosa. E tudo recomeça depois de um ponto final e parágrafo. Com travessão. Há uma palavra a dizer.
E as palavras começam a escorregar pela ponta do tal lápis de carvão... e rodopiam no sentido da mão. E descem incontroláveis, ao ritmo de um único sentimento... a honestidade que rege.
Apagar? Apagar para recomeçar? Onde está a minha borracha? Tinha tantas... vindas de Espanha... ineficazes.
Uma luta, mais uma?... num recomeço, de muitos recomeços.
Um S.O.S.?

"Where are those happy days, they seem so hard to find
I try to reach for you but you have closed your mind
What ever happened to our love?
I wish I understood
It used to feel so nice, it used to be so good
So when you're near me, darling can't you hear me S.O.S.
The love you gave me, nothing else can save me S.O.S.
When you're gone, how can I even try to go on?
When you're gone, well I try, how can I carry on?
You seem so far away but you are standing nearer
You make me feel alive but something died I fear
I really tried to make it out
I wish I understood
What happened to our love, it used to be so good
So when you're near me, darling can't you hear me S.O.S.
The love you gave me, nothing else can save me S.O.S.
When you're gone, how can I even try to go on?
When you're gone, ooh I try, how can I carry on?
So when you're near me, darling can't you hear me S.O.S.
The love you gave me, nothing else can save me S.O.S.
When you're gone, how can I even try to go on?
When you're gone, ooh I try, how can I carry on?
When you're gone, how can I even try to go on?When you're gone, ooh I try, how can I carry on?"
(S.O.S., ABBA)

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Thanks Frank

Perto dos 38 despeço-me dos 37 dedicando-me este "poema".
Sim, mereço... se mereço!
Porque cada etapa da nossa vida deve ser comemorada e homenageada. Pelos erros e conquistas, pelas alegrias e dores... pelo que crescemos... pelos sorrisos e lágrimas que espalhamos.
Porque olho para trás e vejo-me com orgulho... E por que olho para a frente e vejo-me com esperança.
Sim... Mereço!

"And now
the end is near
And so I face
the final curtain
My friend, I'll make it clear
I'll state my case of which I'm certain
I've lived a life that's full

traveled each and every highway
But more, more than this
I did it my way
Regrets, I've had a few

But then again, too few to mention
I did what I had to do
I saw it through without exemption
I planned each charted course

Each careful step along the byway
And more, much more than this
I did it my way
Yes there were times,

I guess you knew
When I bit off more than I could chew
And with it all when there was doubt
I ate it up and spit it out
I grew tall
throught it all
And did it my way
I've loved, laughed and cried

I've had my fill, my share of losing
But now as tears subside
I find it all so amusing
To think I did all that

And may I say, not in a shy way
no, no, not me
I did it my way
For what is a man, what has he got?

If not himself, than he has naugth
To say the things he truly feels
And not the words of one who kneels
The record shows, I took the blows

And did it my way"
(MY WAY - FRANK SINATRA)

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Riscos e rabiscos

Rabisca umas letras, ensaia uns traços e nada... o vazio sai-lhe das mãos... instala-se na mente.
Um enorme vazio que lhe enche a alma e se espalha pelo corpo... que abandona com frequência num sofá qualquer, num cadeirão ou até mesmo em pé.
Tudo em branco... já foi em negro... já teve as cores de um arco-íris.
E o Mundo que não pára de girar.
E vai rabiscando sem sentido, sem rumo definido nas linhas traçadas.
Vai rabiscando sorrisos, ensaiando regressos em passos de dança com avanços e recuos.
E pelas pontas dos dedos na areia molhada saiem formas desconexas, sem sentido... aparente. Sorrisos perdidos, desperdiçados.
Escolhe a medo uma folha de papel de entre as muitas de um caderno, entre muitos. Escolheu, está escolhida. Branca...vazia. E aí coloca os rabiscos que atirou para a areia de uma praia qualquer entre muitas.
Com um carinho desmedido embala este vazio.
Shiiiiuuuuuuuu!!! Não façam barulho.
E em bicos de pés atira a cabeça para trás, descai o corpo, sente a humidade da areia entranhar-se-lhe em todos os poros... o lápis rola-lhe da mão... os rabiscos ficam marcados... o vazio a espaços também.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Lugares

Hilda abriu bem o mapa em cima do capot do carro. Endireitou as dobras e olhou paras as linhas coloridas das estradas e caminhos durante uma vida. Sulcos... Rachas... Tudo cravado na pele com décadas de histórias para narrar.
"Mãe, tu lês e eu conto"... "Era uma vez o patinho Alvinho...". Hilda sorriu num todo.
Voltou a olhar os caminhos traçados no seu mapa, enquanto uma lágrima lhe escorregava cara abaixo e acabava por molhar o pé esquerdo... enfiado numa das chinelas... daquelas que se vendem sempre aos pares e que Hilda sempre desemparelhou.
Hilda escolheu... escolheu não ser assim... escolheu não ir por ali... e por isso o seu mapa tem tantos traços e a sua cara tantos caminhos gravados a fogo.
Voltou a dobrar o mapa, que guardou no meio das folhas de um jornal ... seguiu caminho... o seu caminho... parou em mais não sei quantos lugares... criou mais uns quantos sorrisos e mais uma mão cheia de recordações e voltou a seguir.
Segue sempre... seguirá sempre... e o vento soprará para sempre o seu nome... baixinho... num sussurro... hiiillldaaaaa... hiiiillldaaaaaa...

"Não estando disposto a esperar que a humanidade venha alguma vez a ser melhor... Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora", Jermias, o Fora da Lei - Jorge Palma

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

E vai ser sempre assim...

E a vida é assim... joga... baralha... dá... joga... baralha... e volta a dar.
E a história é a assim... repete-se... em ciclos.
E a cabeça é assim... cresce... muda... volta a crescer... mantém as bases.
E alma é assim... volta... revolta-se... revira-se... serena e agita-se... ama... adora... morre e ressuscita... vive!!!
E o sorriso é assim... abre... esmorece... volta... perde-se e acha-se... resgata-se.
E a honestidade é assim... está cá sempre, ao lado da almofada... doa a quem doer.
E o corpo cresce, move-se, contorce-se, torna-se maior, mais pequeno, engrandesse à medida da alma... à medida da honestidade... à medida de um todo... à medida de um Mundo.
E vai ser sempre assim...

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Gostava

Gostava de escrever sobre flores e sorrisos abertos. Gostava de escrever sobre riachos límpidos e crianças em algazarra. Sobre o cheiro a terra que se entranha na pele e os pores do sol e os nasceres das luas cheias.... e os amigos que falam mais alto... e os apelos do sangue que gritam aos meus ouvidos. Sons que aconchegam.
Gostava de escrever sentido e sentindo, mas caramba o copo meio vazio teima em ganhar força. E olho para o meio cheio e por momentos o ânimo espalha-se pelos meus vazios. E tenho a ousadia de tentar encher o copo todo. E por momentos consigo.
Ciclos, ciclicos em ciclos...
E agarro-me aos pensamentos felizes, porque os pensamentos felizes permitem-me voar (isso ou pó de fada). E eles permanecem e desaparecem à mesma velocidade estonteante em que vou vivendo... a viver.
E será sempre assim...

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Ao cimo de mim

Subi, escalei, galguei... ultrapassei rios, riachos, poças de lama... caí, levantei-me, voltei a cair... mantive-me lá em baixo o tempo necessário para me erguer com força e reaver o meu sorriso (já cá está deste lado).
Rastejar??? Nunca... fiquei imóvel até os ossos colarem.
Rasguei o meu Mundo e outros Mundos... enchi-me de nódoas negras... sangrei e chorei (finalmente).
Cicatrizes??? Coberta delas. Algumas completamente fechadas, outras que ainda vão rebentando. Mas sempre e sempre sem problemas de coluna.
Acreditar??? Ainda não, ainda não dá, ainda é muito cedo... ou talvez já seja tarde demais.
Mas mantem-se uma teimosia surda... e por vezes cega... em chegar lá, mesmo sabendo que isso levará mais que uma vida e já vem das outras vidas.
E vai ser sempre assim...

"Teimoso subi, ao cimo de mim, e no alto rasgei, as voltas que dei", Beijo Leve Triste, Paulo Gonzo

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Procura(mo-nos)

Levanto uma pedra, e depois outra, e mais uma, e ainda aquela ali mais há frente. Afasto uns quantos arbustos. Desvios uns cortinados. Vejo debaixo do colchão. Viro a mala em cima da mesa e remexo em tudo.

Tento saber quem sou e acima de tudo o que sou.

Vejo-me e revejo-me ao espelho, em vários ângulos, qual narciso... espiolho-me da cabeça aos pés. E nada.

Tento que vejas quem eu sou... desesperadamente. Levo uma vida a tentar que vejam quem eu sou. E nada. Que angustia, que esforço inglório, que luta... perco as forças. E é aí, quando se perdem as forças, que está a resposta. É aí o fim do arco-íris. É aí que está o pote de ouro.

A cada misunderstanding é um passo atrás, um recuo, um fechar na concha. E aprendo a viver assim e deixo de querer que me conheçam, que me compreendam. Passo a fazer questão que não me conheçam. É ponto de honra... arrongante.

E compreendo que eu é que tenho de me compreender e aceitar. E passo a olhar para dentro, sem egoísmos finalmente, e a gostar do que vejo. Genuína... sempre.

"And I don't want the world to see me, Cause I don't think that they'd understand. When everything's made to be broken, I just want you to know who I am ", Iris, Goo Goo Dools

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Apertos

Deu um aperto... pequeninooooo. Saudades.
Sei que um dia volto, tenho essa certeza inabalável.
Até lá vou ouvindo relatos, revivendo memórias e roendo imaginariamente as unhas, até não poder mais... e sonhando com o meu regresso.
Até lá vou despertando outros sorrisos e noutros sorrisos e com outros sorrisos.
E aprender a paciência... a calma... no meio da luta e das lutas.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Abandonos

E entregamo-nos ao abandono... durante horas, dias, às vezes anos.
Um abandono que mistura a calma com aquela pequena dor que nos conforta. E vamo-nos deixando andar assim, até pairarmos no incerto.
E quando damos por nós entregámo-nos em definitivo a esse abandono de tudo, de todos, de nós próprios.
E é aí que estamos lá. Que chegámos. Sem descansos.
Quando esse abandono se torna consciente e feliz.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Ver

Só tu não conseguiste ver as dimensões de um amor que passou tudo e por cima de (quase) tudo. Passou por cima dos que me amavam... e eu amava.
Passou por cima de muitos dos meus quereres...
Passou por cima de alguns sentires profundos...
E arrasou com grande parte do que demorei mais de 30 anos a construir.
Só tu não viste a dimensão desse amor!
Muitos não o compreenderam.
Só tu não percebeste que Tavira passou a ser uma opção.
Só tu não percebeste que troquei as Bahamas pela Jamaica.
Só tu não percebeste que passei a ter 3 filhos e que voltei a gostar de basket.
Só tu não viste que larguei a vida... soltei-me dela... desprendi-me.
Pairei simplesmente durante meses a fio...
Se me arrependo? Não. Só de não ter voltado a mim mesma mais cedo no tempo.
De resto... voltaria muito provavelmente a repetir tudo.
Porquê? Porque agora me ergo mais forte, mais capaz, de coluna mais direita ainda... com um sorriso renovado... independentemente de todo o socialmente condenável. Disso nem quero saber. Sempre fui uma outsider, para alguns a esquisita... e continuarei a ser.
Com o tempo ficarão só as boas lembraças. E não será complicado, também não são assim tantas. Muitas foram esmagadas por uma das dores mais profundas que alguma vez senti.
Soltei-me e perdi-me de mim. Estou a regressar...
E como eu adoro regressos!!!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Vou arrumar as chuteiras

Há alturas em que a decisão mais acertada pode ser mesmo arrumar as chuteiras e sentarmo-nos no banco a ver o jogo.
E isso não tem de ser necessáriamente mau... pelo contrário. E sempre nos preservamos de alguns pontapés nas canelas (e nos rins) desnecessários. Já basta os que não podemos de todo evitar.
Eu estou nessa fase!!!
Estou sentada no banco, de chuteiras na mão a ver tudo... a observar tudo. E a aguardar pacientemente que "o" treinador sinta que eu estou capaz de entrar em campo como membro válido para a equipa.
Enquanto isso vou enchendo as minhas prateleiras com mais e mais livros, que cada vez menos penso em afastar de onde estão. Livros que são meus, num espaço muito umbilicalmente meu.
Num espaço onde cada particula de pó tem uma história feita da minha história e de outras histórias de outros.
E aguardo... também é bom poder estar só a ver.

domingo, 12 de julho de 2009

Amêndoa Amarga

Arrasta os pés, do corpo pinga suor, os músculos parecem rasgados e a querer desistir, o calor invade-lhe o corpo para logo de seguida o abandonar. O cabelo que resta está desgrenhado e sujo, a pele áspera e as unhas das mãos e dos pés pintadas de fresco e negras.
Encosta-se ao balcão e pede uma amêndoa amarga, que afinal é doce, e bebe de um gole. Pede outra, sem gelo. E bebe o mais devagar que consegue, o mais devagar que sabe, tão devagar pela primeira vez no seu quase meio século de existências.
E ali está e ali fica e ali perde a noção do tempo e do espaço, que nunca teve, que nunca quiz ter. E dali parte na sua última viagem, numa caminhada sem rumo definido e com linhas bem traçadas. Sem se desencostar do balcão, daquele balcão que poderia ser outro qualquer.
Encostada áquele balcão, onde todos os olhos fingem não a olhar, onde todos os olhos não a conseguem ver, perde-se... e encontra-se...

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Um dia (destes)...

Um dia (destes)... vou à disney e a Paris e a Praga... e ao Vietnam e Cambodja... e a Barcelona, Viena e ilhas gregas.
Um dia (destes)... viajo no tempo e uso o teletranporte.
Um dia (destes)... apanho a boleia do mar e dos ventos.
Um dia (destes)... volto a sentir o aconceho de uns braços e o coração a querer saltar.
Um dia (destes)... breve... estão de volta.
Um dia (destes)... abraço o Mundo e os Mundos... sem dor.
Um dia (destes)... a culpa vai-se e esvai-se por completo.
Um dia (destes)... o sorriso a espaços permanece e o acreditar de corpo e alma regressa a casa.
Um dia (destes)... a vibração sobe ao limite, sem limites.
Um dia (destes)... os ténuos limites do limite alargam-se até se esfumarem no nada do todo.
Esse dia não é hoje... mas começa hoje... e é uma certeza no tempo e no espaço.

terça-feira, 30 de junho de 2009

E quando...

E quando do outro lado do Mundo recebemos notícias surpreendentes...
E quando os amigos são mesmo amigos e sentimos isso de uma forma muito forte...
E quando há sempre alguém cá e lá para nós...
E quando recebemos sorrisos do lado de lá de um vidro baço...
E quando partilhamos enormes pequenezas da vida com pessoas muito grandes durante dias seguidos, que ameaçam tornar-se em anos...
E quando recebemos convites alegremente inesperados...
E quando recebemos ombros e somos ombros...
E quando os desabafos e as palavras mais simples nos unem...
É quando voltamos a Acreditar...
É quando a palavra Partilha faz todo o sentido na vida... finalmente!!!

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Tapete voador

Maria escolheu ao pormenor o seu tapete voador... o tapete que a acompanharia durante toda esta vida, e quem sabe uma outra.
Quando o escolheu era menina do tamanho de uma ervilha e o seu tapete novo, novo e pouco maior que uma ervilha.
Maria foi crescendo e o tapete com ela. Maria atravessou ventos e tempestades, marés e brisas mais suaves, calores fortes com direito a escaldões, chuvas, chuviscos e neves... tudo com o seu tapete... tudo no seu tapete.
A meio da caminhada , mesmo a meio, já os dois tinham poeira entranhada na pele e rasgões, muitos, uns mais remendados que outros... já os dois tinham histórias para contar... já os dois tinha estórias para partilhar...um com o outro... com o Mundo.
E por esta vida, e quem sabe numa outra, acima de tudo ousaram sonhar!

(Abraço enorme Maria...ia. E obrigada pelo Rabisco)

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Espinhos

Uma ligeira dor incomoda-lhe as costas... e essa dor aumenta, fina e penetrante atravessa-lhe o tronco e move-se cada vez com mais dificuldade.
E com medo não espreita. E com medo não toca.
Até que um enorme espelho a obriga a ver o espinho que tem cravado nas costas desde a eternidade.
Mas continua a não lhe mexer. Doi? Cada vez mais e mais. Mas aquela dor já a conhece por dentro e por fora. E a sua presença acaba por ser confortável de tão familiar.
E até a coragem vir assim será.
E quando a coragem veio, embalada pelos amores e desamores, arrancou finalmente a dor. E seguiu, diferente e indiferente às proximas dores.
Espinhos cravados nas costas que se enraizam e emaranham no corpo?!?!?

domingo, 21 de junho de 2009

Amigos ;)

E eles estão lá... estão cá... sempre e para sempre. São sempre os do costume e muito menos do que aqueles que às vezes teimamos em querer acreditar.
Partilhamos vidas, partilhamos risos, partilhamos interiores.
Encostamos ombros, trocamos palavras... são os únicos a quem realmente nos damos... são os únicos que realmente se dão.
E eles estão sempre cá e nós estamos sempre lá.
E por mais que banalizemos a palavra... amigo... no fundo sabemos sempre quem eles são.
E esses mantemos sempre bem junto de nós... da nossa alma... do nosso coração... das nossas lembranças... das nossas histórias.
E é com eles que vamos fazendo...sempre...história.
E é com eles que o sempre ganha um sentido eterno!

("E é então que amigos nos oferecem leito, entra-se cansado e sai-se refeito, luta-se por tudo o que se leva a peito"; Primeiro Dia, Sérgio Godinho)

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Fôlegos

Inspiro bem até ao fundo, de um fôlego só. Retenho o ar o máximo que posso. E é quando percebo que o meu máximo sou eu a dar o meu melhor.
E aceito isso... respeito... e sorrio.
Mesmo que e quando os outros não percebem, não respeitam, não sorriem.
E sei que conseguirei sempre esticar esse máximo, mas já sem me violentar.
E espero por um amor feliz, sem o procurar e no meio dos meus amores felizes.
E volto a inspirar bem fundo, de um fôlego só. E volto a reter o ar o máximo que posso. E volto a sorrir.
E sei que vai ser assim esta vida e outra e outra.
E pela primeira vez nesta vida isso agrada-me.

domingo, 14 de junho de 2009

Espaços

Arrumo um saco para... 1..2..3...5 dias. E sobra espaço. Um espaço imenso para o que é importante. A roupa fica num cantinho. E chocalha durante uma viagem inteira, durante uma vida inteira.
E pelo caminho a música fica lá longe, entre um ouvido e o outro, e a vida mais próxima corre em zumbidos de uma ponta à outra... do carro... da mala... da cabeça... das memórias.
E de repente aparece um espacinho para ti, que não se quer deixar crescer por medo. Sim, admito, por medo? É uma fraqueza, que o seja, não quero nem saber. E em tudo se vê sinais, daqueles que mandam parar, daqueles que alertam para que nem vale a pena voltar a tentar, que o resultado final será sempre uma cara em ferida.
Vou tentando lutar contra isso, mas é um esforço bem fraco... eu sei.
E a concha fecha e eu atiro-me lá para dentro no segundo anterior.
E está quentinho lá dentro. E isso é... seguro.
O carro pára onde é suposto parar e os únicos braços que não ferem enrolam-se no meu pescoço... e eternizo-me assim.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Tempos no tempo do tempo

É tempo de parar...
De poisar as palavras num canto, para que ressurjam mais à frente entre sorrisos e com mais garra.
É tempo de sentar com as pernas à chinês e simplesmente... pensar...parar.
É tempo de apanhar com o vento na cara, no cabelo e saber que isso é muito bom.
É tempo de limpar as armas para as guardar.
É tempo de lutar sem armas, com as as mãos e os risos e os sorrisos.
É tempo de deixar que o coração bata ao seu ritmo, nem que isso implique que ele páre a espaços.
É tempo de pestanejar e de deixar a poeira entranhar-se.
De sentir... e sentir... e deixar sentir.
De fintar os arranhões e lamber as lágrimas, que voltaram... para ficar...para escorregar pelo cantinho da cara.
É tempo de viver!!!

"É tempo de ser forte, atar os ténis com dois nós. Abraçar o vento norte, sorrir a quem se ri de nós", Susana Félix

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Pureza(s)

E quando se perde a pureza perde-se a essência.
E tentamos , quase sempre em vão, agarrarmo-nos a qualquer coisa... qualquer coisa que nos tire da lama em que vivemos. Tentamos desesperadamente procurar e agarra o que resta, para sabermos quem somos... se é este o caminho.
E a lama vai subindo, e pomo-nos em bicos de pés numa luta para manter a cabeça de fora.
Tiramos do nariz e dos olhos, vezes sem conta, aquela massa castanha e mal cheirosa que nos rodeia.
Até que... desistimos de lutar... e aprendemos a viver na lama e com a lama...
...ou não!!! Nunca!!!

terça-feira, 2 de junho de 2009

ping...pong...ping...

Ping...ping...ping...pong.
Cá e lá... Um ontem e um hoje. E o amanhã, quando virá? Virá... virá... virá...
Aqui e ali... Intemporalidade infindável. Respeito.
Que sede... água... água...só água mata a sede. Esta sede.
E o corpo exausto repousa ligeiramente poisado nos lençois brancos de Verão. Já nem deixa marca, os vincos vão-se apagando.
Ping...ping...ping...pong.
Asas suspendem, presas nas costas, fora da caixa.
Pés a exactamente 1 cm do chão... nem mais... nem menos... 1 cm exacto, calculado milimetricamente... por hoje.
Mãos que picam, borbulham, aquecem... e aquecem-nos. Uma chama invisível que descansa na ponta de cada um dos 10 dedos. Mindinho... Seu vizinho... Pai de todos... Fura bolos... e Mata piolhos.
Em lenga-lenga, em alvoroço, em gargalhadas escancaradas.
Ping...ping...ping...pong.
Aqui e ali, agora ou nunca, sempre, para sempre e para depois...
Saltita aqui... Senta ali... ali debaixo do banco, da mesa, dá árvore. Saltita... saltita... saltita.
Pingos de luz pequeninos respingam e enchem um Mundo até transbordar.
E Lilliput desaparece, esfuma-se, fica ainda mais pequena, insignificante. Porque à volta o Mundo acrescenta-se e engrandece.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Saco de papel pardo

Encho um saco, daqueles de papel pardo, com uma mão cheia de palavras. E assim começo uma verdadeira colecção.
Todos os dias acrescentos novas palavras, arrumo-as lé dentro e volto a arrumar.
Componho-as, junto-as, troco-as de sítio... num verdadeiro jogo de prazer absoluto e absurdo viro-as do avesso e mudo-lhes o sentido, com o mesmo sentimento.
Encho a alma com as palavras daquele simples saco de papel pardo... já com nódoas... já com uns dois ou três buracos.
Mas julgam que as palavras caiem? Nunca.
Podem até fugir-me por entre os dedos, mesmo fechados, ou escorregar-me pela boca. Mas dali, daquele saco de papel pardo não saiem. É o seu aconchego, o seu porto seguro.
Ali vivem!

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Linhas

Uma linha ténue, muito mesmo, separa as realidades das ilusões que geramos emocionalmente.
E é nessa linha que criamos asas e voamos entre o lado de cá e o lado de lá. É aí que os sorrisos são mais genuímos. É nessa linha que somos livres e nos libertamos... É nessa linha que nos aventuramos no escuro de olhos bem abertos... E sorrimos mesmo dos cortes... aqueles pequenos cortes que sabem bem.
É aí que perdemos muitas vezes o pé e a razão... e é tão bom.
É nessa linha que nos permitimos ser nós próprios, sem barreiras, sem medos... sem passado, nem futuro.
É nessa linha que somos felizes no presente... e voamos.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Voltar

Apetece-me escrever e nem sei o quê. Rodo as palavras na ponta dos dedos, na ponta da lingua...
E num jogo perigoso, ao limite, vou-as colocando desordenadamente por ordem.
E mudo tudo alguns segundos depois... e volto a reordenar. Num sorriso com lágrimas.
Uma lágrima... duas... escorrem finalmente pela cara. Depois de terem secado... mais de um ano.
Nenhuma palavra, nenhum argumento as convencia.
E do nada, só pela força da energia... e talvez por isso do tudo... voltaram a escorregar, uma e depois outra, do lado esquerdo da cara. Tive de lhes tocar, não fosse só uma ilusão.
As palavras continuam num rodopio entre a ponta dos dedos e a cabeça. Não param, surgem em correria atribulada, em grupos gigantescos. E depois uma e outra e mais outra sozinhas ou em pequenos grupos. Não há regra.
As palavras nasceram livres, sem regras, sem pressões... as palavras libertam-se e libertam-nos a cada instante e fazem-nos renascer a cada momento parado. Basta saber lê-las. Basta trazê-las ao colo.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Perdão

Que culpas temos nós? Que culpas tenho eu?
Tantas e por tantos anos. Carrego-as num saquinho especial debruado a um fio, muito fino, de ouro. Um saquinho que tenho acarinhado... há tempo demais.
Hoje, ontem e sempre resolvi desatar o nó cego desse saquinho.
Espalhei tudo em cima da mesa da cozinha. E lá estava tudo... mas a capacidade de me agredir enfraquecida.
Espreito aqueles destroços. Ainda a medo.
Causei lágrimas e dores? Claro que sim... a mim... aos outros.
Processos, caminhos. Teve de ser? Provavelmente sim, provavelmente não... Talvez.
Caminhos, processos, progressos. Um atrás, três à frente.
Estou a aprender. A aprender? A aprender português e o sentido dos sentidos.
Estou a perdoar-me. Aos poucos, a medo mais uma vez.
E voltei a ter lágrimas.
Afinal não tinham secado.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Feridas

Basília... Que raio de nome lhe haviam de ter posto. Era o nome da parteira que a custo a obrigou a respirar e pumba... já estava escolhido o nome em homenagem à santinha.
Quantas vezes durante o seu, também ele doloroso, percurso escolar não ouviu, entre a gargalhada geral, perguntarem-lhe, em tom de afirmação, se os pais gostavam mesmo dela.
E Basília carregou consigo o peso de quem custou a nascer, de quem não queria abrir os olhos e respirar... e durante toda a vida levou este seu papel muito a sério.
E mais que ser ferida foi-se ferindo e culpando sempre os outros e o Mundo e os acasos desastrosos.
E há conta de um nome... Basília... não deixou entrar luz. Sempre que esta tentava assomar a uma porta ou a uma nesga de uma janela deixada entreaberta por acaso, Basília apressava-se a fechar tudo outra vez e a correr as pesadas cortinas que a envolviam.
E um dia, quem sabe se o mais feliz da sua existência, os olhos cederam aos cansaço e a respiração acabou por murchar.

"Todos estamos feridos. Mas uns estão mais feridos do que outros. São aqueles que se feriram a si próprios, sem disso darem conta", Baptista-Bastos, in "As bicicletas em Setembro"

terça-feira, 19 de maio de 2009

Pairar...para sempre

Um pequeníssima folha vai pairando, lentamente, calmamente, serenamente, entre um algures no céu e um chão qualquer, que escolherá minuciosamente para poisar.
De tão pequena que mal se vê... de tão pequena que mal se faz notar. Passa entre os sopros fortes de um vento de Primavera que teima em não acreditar que o Verão já chegou. E vai poisando cá e lá, aqui e ali...
E de tão pequena que mal se vê... e de tão pequena que mal se faz notar... faz a diferença. E quando se finca no seu chão sabe que é para ficar... para sempre. Até talvez o sopro de um vento de Outono, que nem reparou na chegada do Inverno, a faça pairar de novo até novas paragens, onde se fincará mais uma vez para sempre.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

JÁ!!!!

Devolve-me o que não é teu e me levaste na tua partida acidentada. Devolve-me já!!!!!
Por mais que te grite há muito que deixaste de me ouvir.
Ao princípio pensei que tinha sido por engano que carregaste no meio das tuas as minhas... o meu ser.
Depois quiz acreditar que era um truque para mais uma vez poderes voltar... com a desculpa ideial da entrega... uma entrega que numa foi total... uma entrega ilusória nos tempos e nos espaços.
Ainda tive a suprema ousadia de acreditar que me querias guardar ilegitimamente junto a ti.
Mas o tempo foi voando e rodopiando à minha volta. Mas o tempo foi-me desalinhando o cabelo, as roupas e pondo os pensamentos estranhamente no lugar. E aí vi que foi por maldade...genuína maldade.
Nem comigo, nem sem mim!!! Um olho por olho, dente por dente!!!
Foste partindo para outras vidas, mas saqueaste a minha antes de a deixares por completo.
Saíste com os despojos da batalha... como um vencedor...
Mas sabes, se calhar já não quero que me devolvas o que me roubaste. Voltará sempre com o teu cheiro entranhado. E isso eu já não quero. Repugna-me.
E sabes, fica com os despojos da tua vitória. Que se transformará em amarga. Porque sempre que olhares para eles saberás que sem mim aquilo que roubaste serão só despojos, sem valor, sem vida, inanimados pelo calor das memórias felizes.
Eu? Eu estou a fazer o exercício mais feliz da minha vida... caminhar... voltar a acreditar... construir um novo sorriso...

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Margens

Uma corda invisível, imperceptível, resistente liga uma margem à outra. Liga-nos um ao outro, na mesma margem, no mesmo lado de cá e no mesmo lado de lá.
Um fio de baba de aranha, que não quebra nunca, mesmo com o peso dos nososs pés, dos nossos corpos, onde a alma é que pesa mais... range.
Respirações contidas, que se contêm, com medo das ondulações das brisas. Mas... esta corda não parte. Evapora-se, sublima-se... mas não se parte.
E uma alma de elefante suspende-se no ar, nos ares... e as respirações retornam... enfim... enfim soltas.
E as aranhas apressam-se a reforçar as cordas que nos prendem, sem nos amarrar. Uma aranha de estimação. Enibriados pelas alturas tentamos fugir às tonturas dos cheiros que queremos agarrar à pele macerada pelo rugir do tempo.
Uma ruga renasce... e outra... e mais mil. E o tempo prende-nos às margens... de cá e de lá. E é nesse fio da navalha que reencontramos os sorrisos perdidos.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Pairar descalça

Vou-me descalçar e andar eternamente descalça. Pisar o chão, todos os chãos que houver para pisar. Sem pisar ninguém, sem pisar alguém. Nunca!
Sentir, simplesmente sentir o chão e o ar que quiser correr entre o chão e os pés. E pairar, suspensa por umas asas imperceptíveis. Sólidas. Que estão completamente à mostra. Finalmente. Fora da caixa onde as fui obrigada a pôr por vontade própria.
Sentir o ar na sola dos pés, nos pés inteiros. Sentir as texturas e as respirações das pedras e das areias... que com o tempo se entranham em nós... pelos dedos dos pés... os mindinhos... só pelos mindinhos, para depois se irem alastrando até se terem impregnado... até os pés mudarem de cor, para um tom ocre... e isso ser confundido com sujidade.
E ficar mesmo com os pés sujos, e de alma lavada. E sorrir com a dor de um corte... ou de muitos pequenos cortes... e voltar a sorrir só porque sim.
Aí saberei que estou viva.
Ou talvez seja só um encantamento, uma ilusão de tão desejados os sentires.
Doce ilusão que me vai embalando pelos caminhos sem sorrisos.
Agarro-a, não a largo. Aperto-a contra o peito até deixar marcas. Mas não a sufoco...

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Sinais em nós

Sinais para dentro e para fora. Sinais de luz, de fogo, de fumo... imperceptíveis... arrasantes.
Sinais dos tempos que são de todos os tempos e de tempo algum.
E arrastamo-nos em sinais que trilham a carne e a marcam.
E carregamos esses sinais na carne, no sangue, na memória... em memórias.
Como animais que se marcam a ferro... por todo um sempre.
E ficamos um número; mais um entre infinitos.
E tudo muda quando ousamos mudar os sinais que o tempo teima em manter colados à nossa pele. E aí arrancamos o sorriso de quem mudou de número... para um número infinitamente finito.
E é a melhor solidão de todas... um não pertencer pertencendo.
É um pertencer a nós... em nós.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Respirar

Sinto as respirações... compasadas agora... mais corridas depois. E fecho os olhos. Respiro. Respiro-me. Lembro-me de repirar. De sentir os cheiros que me envolvem e me assaltam. E com os cheiros exprimento sensações de pele... que se arrepia... que está viva.
Sinto milimetricamente as respirações... as minhas... as tuas... as nossas... as que deambulam em meu...nosso... redor, que rodopiam em movimentos estranhamente curiosos.
Fico alerta e tento não parar de respirar e de sentir as repirações. Num esforço... grande... enorme... continuo a respirar. E os cheiros que de novo me invadem e me percorrem por dentro do corpo e do ser!
Sinto outra vez as respirações... devagarinho... timidas... voltam a respirar.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Shiuuuuuu!!!!!!!!!

Percorro um vão de escada e sento-me no terceiro degrau a contar do nada... e poiso os pés três degraus acima... ou ao lado.
E páro o cérebro, só para ouvir os silêncios prolongados que surgem por todos os caminhos caminhados.
Silêncios de mares... no fundo de uma estrela do mar...
Silêncios de pedras... pisadas, andadas, corridas, atiradas...
Silêncios pelos silêncios... Silêncios mudos... Silêncios que gritam sem sons...
E nos silêncios oiço o tique-taque do cérebro que parei... e que borbulha pelo momento de voltar a rebolar-se na areia húmida de um qualquer início de dia quente.
Porque é no início dos dias bem quentes que se ouvem melhor os silêncios... com o ouvido encostado às pedras... com grãos de areia... e a água de um mar sem sal a invadir-nos os dedos dos pés.
Uma porta mágica para o infidável do infinito.
Shiuuuuu!!! Levanto os pés dos degraus... vai começar tudo outra vez.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Espinhos de Abril

Um espinho de cravo crava-se-lhe numa perna, bem junto ao joelho, à articulazção do joelho, e imobiliza-a.
Espinhos na alma? No ser? No coração? Demasiado banal... demasiado visto... demasiado ouvido. Aí cravam-se estacas... algumas bem fundo.
Retira o espinho sem contemplações e prosegue o caminho arenoso enquanto um fio de sangue, que rapidamente se atorrenta, lhe escorre pela perna e lhe encharca a meia.
Sapatos na mão... descalça as meias e deixa que o seu sangue humedeça primeiro a areia e depois se misture nela, e com ela crie uma pasta respirante em redor do pé.
Não será um espinho de cravo que lhe tolherá os movimentos... lhe turvará a visão... ou lhe retirará a liberdade serena... não será um espinho de cravo num Abril...

sábado, 18 de abril de 2009

Portas

Encontrei mais uma porta. Entre uma caneca de café quente e pensamentos... serenos... ponderados... calmos.
E de repente o sentido dos sentidos e dos sentires invade as minhas salas, os meus poros, as minhas entranhas. E espalha-se... em luz.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Na ponta dos dedos

Uma chuva miudinha entranhou-se-lhe na carne e começou a roer-lhe os ossos. Mas mesmo assim sorria. Lídia sorria à vida apesar de tudo, apesar dos pesares... e mesmo em dias muito pesarosos.
Esta chuva mais que miudinha também lhe lavou a roupa, a pele, as lágrimas, a alma.
Lídia caminhou durante três horas debaixo da chuva miudinha, de chapéu esquecido na mão. Ou terão sido três dias? Três anos?
Lídia gastou uma vida a caminhar à chuva... ficou sem créditos.
Mas Lídia sorria com a certeza de que via, como ninguém, um arco-iris. Mesmo com a névoa que lhe cobria a vista desde que viu a luz do dia.
Lídia via na ponta dos dedos as cores e os cheiros da chuva.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Querer crer

Querer criar... crer em criar... crer...crer...crer...
Querer crer que se quer, mesmo o que já não se quer e não se crê.
A dúvida no que ainda se crê... se é que ainda se pode crer. Porque querer pode-se sempre.
E queremos o Mundo, sem crermos no Mundo... com paixão.
A paixão do crer que se perde nas vielas da vida, que se vai esboroando, desfiando, desviando... até se tornar numa pasta de lama... que borbulha em cadências incompreensíveis.
Mas nem tudo tem de ser intendível... e a paixão... e o crer... não se entendem... sentem-se, vivem-se... muitas vezes quase ao sufocamento...
... muitas vezes quase até ao limite da linha, altura em que a pasta de lama se molda e vai criando formas e fórmulas.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Pontinhos

Um pequeno pontinho que engradece e se agiganta... que se resume a ele próprio... que oscila e gira e rola e roda e rebola... sempre ao sabor das vagas. Com o cheiro do mar lá longe colado à pele. Num piquenique com praia e mata... areia e caruma... formigas, muitas formigas que passarinham nos intervalos das milgalhas que lhes deixam propositadamente, como se de uma atitude negligente se tratasse. E as carregam sem esforços e sem queixumes e sem lamúrias.
E no final do dia... e no final da vida... enrola-se a toalha de quadrados, recolhe-se o lixo e espera-se que o Verão volte a chegar.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Abraços

Baixinho gritou-lhe um abraço.
Estremeceu profundamente. Do abraço? Do grito sussurado pela manhã?
Nunca saberá... nunca saberão.
Porque às vezes o nunca existe para sempre... tem de existir.
Nem que seja tirado a ferros de um sempre.
Sempres que não existem... a não ser que possa haver nuncas.
Gémeos... siameses... inseparáveis... indissociáveis...
Abraçados para sempre... sem nunca se apartarem por mais de alguns breves segundos.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Memórias

Lembrei-me de ti hoje. Como deves estar crescida.
Como já não nos reconheceremos... de forma alguma...
Lembrei-me com as saudades das memórias.
As piores saudades de todas... que também podem viver como as melhores.
Sim, porque a memória e as suas memórias atraiçoam... no bom e no mau, no melhor e no pior.
Tentamos agarrar o lado bom e logo se arrasta por entre o chão, subindo-nos por uma das pernas... só por uma... enrolando-se desde a cintura ao pescoço e apanhando-nos os braços... as saudades.
Que nos imobilizam e paralizam e tolhem movimentos.
Por requinte de malvadez deixa-nos rodar o pescoço em 360 graus... para a esquerda e para a direita.
E aí procuramos desesperadamente uma nesga de luz que nos indique o caminho.
E aí procuramos com avidez qual o percurso que queremos seguir... queremos um com menos altos, menos pedras, menos curvas e contracurvas.
E quando finalmente essas saudades voltam a soltar-nos o corpo acabamos invariavelmente a escolher o caminho mais irregular!
E lá voltamos a erguer a cabeça e a caminhar... primeiro a medo... depois com outra confiança recém adquirida.
Lá voltamos a cometer alguns dos mesmos erros e outros novos acabadinhos de inventar.
La voltamos a soltar risos e gargalhadas... aplausos à vida... até...
Até um dia!!!

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Silêncios barulhentos

Encosto-me a uma parede. A transpiração que nunca tive escorre-me pelo corpo. Imagino uma pequena poça de água com sabor a sal ao lado do meu pé esquerdo... e choro. Nem sei bem porquê, mas choro. Apetece-me, pronto... choro.
Importam-se?
Estranhamente as lágrimas não querem abandonar-me os olhos. Mas eu, num imenso exercício de teimosia, choro durante horas. Encostada a uma parede qualquer. Sem noção de onde apareceu aquela parede e onde foi posta. Sem lágrimas.
É aquela... poderia ser outra qualquer.
O barulho ensurdecedor do silêncio fere-me os tímpanos.
O silêncio do Mundo é esmagador.
O silêncio das formigas que correm apressadamente pelas ruas, sempre de sorriso fechado... sempre prontas a cobrar...
O silêncio dos carros, motas, bicicletas em passos apressados...
O silêncio dos passos pequeninos...
O silêncio do burburinho de conversas gritadas ou sussurradas.
Passei a ouvir tudo muito ao longe... até só querer ouvir estes absurdos silêncios.
Que agridem e confortam.
Que empurram e curam as feridas.
Que esmagam, mas carregam ao colo.
E as lágrimas, tão teimosas, que não caiem... à demasiados segundos.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

De pés neste chão

Poiso um pé... devagarinho. Depois o outro.
E escolho percorrer assim o Mundo... a partir de agora.
Não fazer barulho.
Não chocalhar.
Não acordar mais monstros adormecidos milenarmente.
E fazer assim a diferença.
Efeito surpresa!
A serenidade na ponta das mãos... nos dedos.
Ensinamentos tão milenares quanto os monstros de várias vidas.
E a possibilidade de sermos diferentes a cada momento.
A alegria de podermos ser incoerentes...ou parecer... sem sermos inconsistentes.
Sem traições... mesmo assim.
Honestidades.
Poiso outra vez o primeiro pé... devagarinho. E mais uma vez o segundo pé.
Num silêncio estrondoso... a partir de agora.
Um silêncio que chocalha, faz barulho, abana... e ensurdece os monstros milenarmente adormecidos.
Reposicionamentos mil... à velocidade do Mundo.
Entre abraços mil... sorrisos... lágrimas secas.
Correrias pelo Mundo... sem barulhos... em silêncios ensurdecedores.
E num salto veloz outros Mundos se abrem... automaticamente... de portas escancaradas e braços abertos, prontos para se fecharem sobre os nossos ombros... sem apertarem em demasia, sem quererem asfixiar.
Ir e vir.
A asfixia... viscosa... escorrega-nos das mãos, por entre os dedos, até se esborrachar na terra seca e sem vida além da vida.
O óbvio que sempre lá esteve... que só agora entra pelas órbitas dos olhos sem lentes filtrantes.
A escolha a cada instante.
A alegria do livre arbítrio.
Sem mais julgamentos sumários minuto a minuto... segundo a segundo.
A relatividade.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Prosas

Uma folha em branco... um caderno liso...
Uma alma cheia... um coração em revolução... uma cabeça em turbilhão... contantes.
Porque queremos ser verdes quando nascemos amarelos?
Desrespeitos mil.
Atropelos.
Rasgões.
E um fim que tráz princípios... recomeços.... por fim.
Circulos... em circulo... e aos circulos.
Acabaram com o espaço para quadrados... triangulos... rectângulos.... no tempo.
Estás dentro?
E aguentas? Aguentas estar dentro? Aguentas-te a estar fora?
Palavras ditas de forma ilegível empurram-nos... para fins e recomeços.
Palavras lidas de forma inaudível arrastam-nos... para recomeços e fins.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Viver depois das seis

E o que acontece sempre depois das seis? Depende, depende tanto...
Corre, corre... grita... esbraceja... vira aqui, sobe ali... entra e sai... sai e entra... corre, corre...
Nããããoooooooo!!!!!! Recuso-me. Recusem-se.
Reaprendamos a escrever e escrevamos um Manifesto.
Reaprendamos as causas e lutemos pelo Manifesto.
Aprendamos a descer a avenida e a cruzar os jardins.
Aprendamos a saber dar a mão e a ver além.
Basta alguma sabedoria e alguns sorrisos.
Basta não tentarmos endireitar curvas que nasceram para não ser direitas.
Basta respirar... respeitar... viver!!!

quinta-feira, 26 de março de 2009

Jogos

E de repente tudo à minha frente foi mudando de cor e ficando pouco nítido. Sento-me no chão com a cabeça entre as mãos... ao longe o bater da bola no campo de basket em alcatrão... e mais longe ainda um amontoado de vozes em calções e t-shirt, que se afastam cada vez mais e se tornam pouco nítidas.
Queria não estar ali...
Queria não sentir a cabeça oca...
Queria não ver o mundo através de um filtro de cores falsas...
Queria não ter o Mundo, aquele Mundo em especial, de olhos postos em mim... a salivar enquanto esperam que dê um último suspiro. Para depois simplemente esquecerem mais uma existência.
Queria não ver os olhos de sangue e decepção quando consigo soltar uma lágrima... como uma lágrima de libertação pode ser um punhal!!!
Sinto os passos do afastamento... lá bem longe ainda.
E fica quem fica...
E tudo não passa de um grande jogo!!!

segunda-feira, 23 de março de 2009

Pesos (e halteres)

Um peso abate-se sobre mim. Aiiii... é enorme, pesado.
Olho em volta, tento espreitar por entre as nuvens... mas a chuva turva-me os olhos, cega-me durante uma vida.
Quero achar que é mais uma vez o peso do Mundo... mas esse paira ao meu lado, num abraço quente e lento de fúria alegre.
Vou arrastando os pés por entre o lamaçal que se juntou à minha volta... e a lama teima em subir e já me cobre os joelhos... que não dobram... que não vergam.... e o peso aumenta... e o Mundo sorri ao meu lado... irónico!
Tiro a lama à pásada com as mãos enegrecidas pela caminhada.
Ela volta a tentar submergir-me e eu volto a tirar tudo. E é assim, e sempre foi assim, e será sempre assim.
O peso aumenta a cada migalha de segundo. Mas eu já não o sinto. Carrego-o numa abraço dado pelos sorrisos dos que me estão cravados.
E caibo... à minha maneira... do meu modo... mas finalmente caibo, e mantendo os joelhos direitos.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Agitações

Braços agitados... agitam-se... a chamar a atenção.
Como a alma, sempre em agitação... sempre com nódoas negras que por vezes sangram desmedidamente, num sinal de vida... ou num grito de alerta.
E corre-se numa corrida contra o tempo, mas a favor do tempo... até ao ponto de paragem.
Onde a alma serena até à etapa seguinte... em forma de pedra... em forma de erva... em forma de água que corre... contra o tempo... a favor do tempo... até ao ponto de paragem.
Para voltar a agitar-se, sempre desmedidamente.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Sorrisos

Que sorriso é esse?
Gosto de te ver sorrir... mesmo quando é um sorriso triste.
Gosto que me sorrias quando menos espero e quando estou à epera.
Gosto desse teu sorriso sereno... mesmo quando a angústia salta pelo canto dos lábios e os teus olhos se enchem de lágrimas.
Quero abraçar-te sempre nesse sorriso e que me abraces a sorrir.
Porque um sorriso aperta um abraço e estende-o aos seus limites...
... os limites onde o humano se transcende, se entrelaça, se embaraça... num sorriso... com um sorriso...

segunda-feira, 16 de março de 2009

grita

pim... pam... pum... salta à corda, esconde-esconde...
pião a rodar no chão... berlindes a postos... bonecas penteadas... e...
e... e...
mochila às costas... livros na mão... baton a postos...
jeitos e maneira... olhares de lado... e... e... e...
cresce... cresce... cresce...
tens de crescer... rápido, veloz... antes que te pisem, antes que te esmaguem os ossos e a alma.
a Terra do Nunca não existe... não podes voar... não tens para onde fugir...
estas barricado... em ti próprio.
a não ser que...
isso... tu consegues... vá, grita... grita alto... grita com força.
e além das núvens verás que afinal a Terra do Nunca existe... mesmo quando só tu a consegues ver. afinal podes voar...

sexta-feira, 13 de março de 2009

Curvados

Curvados, com o peso do Mundo e da vida às costas, atravessam estradas, cruzam passeios, galgam degraus de dois em dois (sim, sempre de dois em dois)...
Sempre curvados e de olhar turvo esforçam um sorriso que atribuem ao Sol... dizem que faz milagres. E continuam a caminhar.
Vêm de lugar nenhum e rumam a lugar algum.
Só vêm o chão e os seus próprios pés... conseguem ainda receber alguna aromas, muitos dos quais nem sabem já identificar... acabando por se misturar, perder a forma e a cor, o sentido, a razão...
Nascem curvados, vivem curvados... vergam-se ainda mais, enaquanto se arrastam nas lamas da vida. E morrem... sujos, rotos, baços... e curvados.

Sai

Sai com o sorriso com que não entrou.
Sai com as mãos carregadas, quando as trouxe vazias.
Sai com um andar mais leve, quando entrou de andar pesado.
Sai com as feições aligeiradas e entrou de semblante rígido.
Sai com um brilho nos olhos que não trazia...
Até amanhã, camarada!
Na alma... Na alma? O mesmo vazio esborratado.

terça-feira, 10 de março de 2009

Vês-me?

Olha!!! Olha!!!
Olha para aqui! Olha para mim!
Já... já não me vês?
Mas... mas eu estou aqui... continuo aqui... como sempre estive... como sempre.
Já não sou a mesma? Achas mesmo?
Dá-me um tempo para ver e rever... ver e rever... rever e ver...
E... tens razão... mudei... muito.
Que bom!!!
Fui uma sombra tua durante tempo de mais. Sim a tua sombra, nem sequer uma sombra do que eu era estava a conseguir ser.
O tempo foi pouco? Nãããooooo... Um minito que seja é tempo a mais... Dois minutos uma vida... Três uma eternidade. E eu dediquei-te minutos em excesso.
Mas despertei... e sem beijo de príncipe...
Depertei por mim e para mim.
Tens razão... mudei... e muito... e felizmente.
Rasguei-me por dentro e por fora. Um sangue vermelho saiu-me pelos feridas, pelos poros, pela boca, pela alma. E lavou-me!
Virei a alma do avesso e tornei a endireitá-la e a moldá-la a mim... só a mim.
E... não tens razão... não mudei... somente voltei a ser eu.
E... fui eu afinal quem deixou de te ver.

domingo, 8 de março de 2009

O tal do amor...

...encosto-me à gaveta do meio e escorrego por uma frincha... e escondo-me do amor num passo de tango mal dado. Vejo por uma nesga da gaveta do meio as reviravoltas a pares, em tangos misteriosos. E invejo aqueles pares, aqueles sorrisos e olhos semi-serrados. E escondo-me bem no fundo da gaveta do meio, onde me encostei e para onde me esgueirei... cada vez mais assustada, mas sem conseguir fechar a gaveta de vez. Guardando sempre na memória o som de um tango longínquo, vivido a par.

(comentário para o blog Bandida)

E como o pensamento ainda é livre...

E como o pensamento ainda é livre...
Eu vou pensar que a minha liberdade está aí... que os sonhos estão no virar da esquina...uns.
E outros bem guardados na palma da minha mão. E que eu vou voar sempre...acompanhada de mim... acompanhada do Mundo...meu.
Eu vou pensar que as minhas lutas ajudam, nem que pouquinho, a fazer a diferença... a fazer com que o Mundo gire de uma forma mais suave, mas com muita garra.
Eu vou pensar que vou voltar a acreditar e que vou continuar a agarrar este sorriso... para sempre.
Eu vou pensar que vou continuar a fazer sorrir o Mundo...meu.
Eu vou pensar... acreditar... sonhar... voar... planar... lutar... rir e sorrir... e erguer-me sempre que derrapar...
Eu vou pensar...pensar...penasar...

sábado, 7 de março de 2009

Que é feito?...

Que é feito de ti?
Por onde andas agora... que ruas percorres... que caminhos escolheste seguir?
Que é feito de ti desde que te apartaste de mim... para tanto sempre?
Que fazes tu numa sexta à noite? Ou num sábado logo de manhã?
Que é feito de ti?
Continuas? Ou mudaste?
Eu continuo eu... mas cresci que me fartei.
Que é feito de mim?
Continuo aqui... com os olhos postos no Mundo... e a vida a crescer por dentro e por fora.
Continuo aqui... com os pés aqui e além... com a alma ali e aqui.
Que é feito de ti?
Que é feito de ti?
Que é feito de ti?...

quarta-feira, 4 de março de 2009

Por trás dos olhos que se fecharam lentamente

Os olhos vão-se fechando lentamente... ao sabor da dor... do sono... do peso dos anos. E encerram dentro de si todos os tesouros.
Os tesouros de uma vida vivida a várias vidas.
Os olhos que se fecham lentamente sabem que por trás deles está um tempo de sonhos... onde alegrias e tristezas; sorrisos, risos e lágrimas; contorcionismos e alongamentos; rugas e espasmos; amor, paixão e dor se misturam invarialvelmente... sem pedirem licença a ninguém. Misturam-se, baralham-se e deambulam por trás dos olhos que se fecharam lentamente... e abrem o espaço ao sonho no seu estado mais puro e intimista.
...aqueles sonhos que não pertencem a mais ninguém, mas carregam na bagagem um Mundo inteiro... que roda numa velocidade desequilibrante por trás dos olhos que se foram fechando lentamente.
E é por isto, e um outro tanto, que muitos destes olhos que se vão fechando lentamente escolhem nunca mais voltar a abrir...

A sós

Estar a sós sem se estar só... um desafio imenso, que nos engradece brutalmente.
Muitas vezes o desafio de um vida, ou de meia vida. Se bem que...quando chegamos realmente a meio da vida? Aos 40??? Antes? Depois?
E de que vida estaremos a falar? Desta, terrena, palpável?... Ou de uma vida mais imensa e mais contínua?
Quando chegamos então a meio da caminhada? E quando termina ela? Quais os requisitos que têm de ser cumpridos?... Respostas que só chegam nas vivências da vida. E por vezes em forma de sorriso... e outras de uma grande dor.
E no meio de todo este turbilhão que é a vida (e é-o sempre de alguma forma), erguemos um dia os olhos do nosso "umbigo" e conseguimos perceber que é ele a nossa melhor companhia, que é ele que permite nunca estarmos sós...

"Mãe, estamos aqui sozinhos!..."
"Não filho. Tu estás contigo e comigo, já somos dois... E eu estou comigo e contigo, já somos quatro."

segunda-feira, 2 de março de 2009

Amar

Maaaarrrríííííííííílllliiiiiiiaaaaaaaaaa!!!!!!!!!! AMOOOOO-TE!!!!!!
E o eco repetiu cem mil vezes... na sua voz rouca de eco... que alguém ama a Marília.
Mas aquela voz rouca, com uma mensagem doce, só feriu Marília. Porque Marília não ama esse alguém... não da mesma forma, não com a mesma intesidade, que alguém ama Marília.
E aquele amor que lhe é dado, todos os dias e com todas as formas só a fere, a rasga, a faz sofrer. Porque sabe que nunca conseguirá corresponder áquele amor.
Mas o que Marília na sua pequenez de ser humano não sabe é que aquele amor não pede o mesmo amor de volta. Aquele amor pede colo, carinho compreensão. Pede simplesmente para estar ao lado.
Alguém que ama Marília já percebeu as regras do jogo e sabe bem que Marília nunca o amará.
E com aquele eco só quer que aquele mundo saiba o quanto ele ama Marília...
...só quer que Marília saiba que é amada, sem ter que amar!

domingo, 1 de março de 2009

Desilusão?

"Mais um feio!!!"... viu-o e apaixonou-se... apaixonaram-se.
Viraram o mundo do avesso, sacudiram-no e partiram-no em mil pedacinhos. Amaram-se no limite e até aos limites. Estavam juntos desde sempre e tinham a certeza que para sempre.
Abandonaram tudo, feriram... e depois feriram-se. Sempre de mão dada, sempre... até as mãos se começarem a descolar de forma brusca, violenta...
...e as lágrimas foram tantas que secaram. E a dor foi tão imensa! E as decobertas tão duras... a descoberta da desonestidade no amor... alma em farrapos.
Desilusão?

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Ilusão?

Naquela manhã sentaram-se na cama e decidiram. Decidiram um sonho e viveram-no até ao limite. Uns dois meses depois e esse sonho crescia na sua barriga... que ele via crescer e ajudava a cuidar com um carinho imenso. Nove meses depois disso e já esse sonho se materializava em pleno. Um sonho lindo... o sonho mais lindo... que ficou completo cinco anos depois, de mão dada com um outro sonho... com outro sonho mais lindo.
Pelo caminho eles foram-se perdendo um do outro. Deixaram de ter sonhos em conjunto... Deixaram de se reencontrar pela manhã num beijo de bom-dia ou à noite em abraços prolongados... Dormiam de costas voltadas... Viviam de costas voltadas... Seguiram caminhos opostos que os rasgou um do outro e os dilacerou a cada um.
Onde se perderam?
Ilusão?!?!?

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Vidas vivas

Cruzou os braços e pela primeira vez teve aquela consciência de que respirava. Tocou nos ossos das costelas, sentiu a pele e o movimento da respiração, mesmo por cima da camisola. E sentiu dor.
Reacção imediata... franziu a cara... e depois sorriu porque estava viva. E quando se está vivo pode continuar-se a luta.
E decidiu que ia vencer a doença, e que não iria permitir ser abatida por ela. Mesmo que seja crónica... não a ia deixar avançar e contaminar-lhe o resto do corpo.
Não podia! Não queria!
Não pode e não quer.
Na quinta a algazarra das crianças abraçou-a. O riso dos seus sobressaía nos seus ouvidos e no seu sentir.
Lindos!!! Um homem aranha pequenino a tentar escalar as redes que o separam dos animais. Uma espanhola, dançarina de rumba, a correr de saltos altos entre a relva, as ervas e a terra batida. Lindos!!!
E no final do dia, sem conseguir sequer passar com as mãos pela pele por causa das dores, sente-se feliz. Muito feliz. Porque está viva e vê a vida a crescer.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Por curiosidade

Por curiosidade, um dia, pôs os olhos de fora...
... depois as orelhas e o nariz... sim, ousou pôr as orelhas e o nariz de fora em simultâneo.
E finalmente esticou o pescoço para ver.
Apurou os sentidos.
Sim, já que tinha tido a coragem de, por curiosidade, espreitar ia aproveitar para beber tudo.
E bebeu com a sofregidão de quem tem estado trancada há muitos séculos. Bebeu até não sobrar gota.
E no dia a seguir, e no outro e depois no outro, e ainda no que veio depois... por curiosidade... continuou a espreitar, e a beber o Mundo, e a receber do Mundo.
Foi-o fazendo cada vez mais lentamente. E depois dos primeiros meses, ou anos, de embriaguez foi fazendo tudo e espreitando vagarosamente, com mais lentidão. Continuou a nunca estudar passos ou movimentos. Passou simplesmente a viver mais os momentos. E a crescer ainda mais com isso. E sempre por curiosidade.
Até que um dia, sem dar por isso, percebeu que, por curiosidade, tinha o corpo todo de fora. Assustou-se, paralizou por momentos, pensou em voltar para dentro. Mas o caminho de regresso estava interditado pela sua própria vontade.
Naquele dia percebeu que, por curiosidade, além de beber do Mundo e o Mundo também ela dava de beber a esse mesmo Mundo.
E tudo em nome de uma imensa curiosidade!!!

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Procurar

Procurou pela casa toda.
Em cada cantinho, debaixo dos tapetes e dos armários e das camas,
Atrás das portas e nas caixas dos brinquedos dos miúdos.
Mas nada!!!
Viu muito bem dentro das gavetas, das malas que estão guardadas no armário, por trás dos cortinados e dentro dos vasos das plantas que tem na varanda.
Até levantou o colchão, não fossem ter caido sem querer lá para baixo.
Abriu os armários da cozinha, espreitou na máquina da roupa e dentro da tulha.
Nada! Nada! Nada!
Durante uma manhã inteira procurou e repetiu passos, não fosse ter visto bem.
Revirou a casa de alto a baixo, de frente para trás, da esquerda para a direita, na diagonal... e... Nada!!!
Finalmente, esgotada, sentou-se no sofá, recostada nas almofadas já sem cor. E sentiu algo no bolso do robe. Lá estava o que procurou uma manhã inteira... a serenidade... bem no seu bolso!...

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Prioridades

O mundo dos blogs pode ser fascinante. Muitas vezes aí as pessoas encontram pontos de afinidade, revêm-se no que leêm, nas palavras e sentires dos outros. Que muitas vezes não conhecem, nem nunca conheceram... a não ser um nick e vários sentires evolutivos.
Cecília tinha passado a tarde a deambular pela famosa blogosfera, e foi descobrindo um mundo paralelo que se desenvolve mesmo ao lado dela. E foi conquistando terreno neste reino onde, atrás de um nome imaginário, se passam vidas bem reais.
Andou por ali perdida durante horas... fascinada com que ia descobrindo e lendo. A noite ia bem avançada, mas o sono não vinha. Estores fechados para que o frio da rua não entrasse pelas madeiras das janelas já apodrecidas. Velas acessas, o cheiro a insenço no ar e só a luz obrigatoria a que sentisse o calor do conforto.
Algures leu um post sobre a solidão... e oc omentário. E pensou como sabe tão bem sentir-se a sua melhor companhia. Cecília tem a certeza que a vida lhe deu de que nunca saberá o que é a solidão... ou estar sózinha. E há quem esteja tão só no meio da multidão ou da banalidade que escolheu como forma de vida!!!
Mais à frente um outro post, engraçado, sobre listas de tarefas e missões cumpridas. E Cecília pensa em listas... e prioridades... E como ao longo da vida tem vindo a alterar a sua lista de prioridades... "E como eu também adoro fazer listas!!!", pensou com um sorriso.
E em pouco tempo abandonou o computador, pegou no caderno de capa dura, às cores, onde escreve e reescreve o que é mesmo só seu, e no lápis, bem afiado, e começou uma nova lista de prioridades.
16 de Fevereiro de 2009
(Sala)
Lista de Prioridades:
1 - Sorrir para mim todos os dias
2 - Abraçar os gordos todos os dias e dizer-lhes o quanto os amo
3 - Tentar ralhar menos com eles
4 - Saúde... reiki
5 - Sentir... mesmo que doa
6 - Levar os gordos à Disneylândia
7 - Amar e respeitar as formas e os seres
8 - Seguir os sonhos
9 - Manter a honestidade e verticalidade... mesmo que doa outra vez
10 - Voltar a sorrir
Cecília fechou o caderno de capa dura, às cores, onde escreve e reescreve o que é mesmo só seu, encostou-lhe o lápis, que estava já a ficar sem bico... e... sorriu.

Carta de amor pós-São Valentim

Lisboa, 15 de Fevereiro de 2009

Meu querido? Olá?
Não sei começar cartas de "amor"... é oficial.

Há quase um ano que nada sei de ti. E, (não muito) curiosamente, não quero saber.
Não quero saber o que fazes o que sentes, por onde andas. Não te desejo qualquer mal ou sofrimento... simplesmente não quero saber, nem sequer cruzar-me contigo. E muito menos quero que saibas de mim, da minha vida. Aliás, proibi o mundo de falar o teu nome e de te ir falar de mim. Porque havia quem insistisse que deveriamos ficar juntos outra vez. Que maldade seria para mim mesma.
Mas isso não quer dizer que não pense em ti, que não me recorde com carinho e saudade do que vivi de bom ao teu lado, e que me esforce (por questões de segurança) para não me esquecer de tudo o que me fizeste sofrer (e foi muito... e foi muito mau).
Tenho acima de tudo saudades das tuas mãos e da tua voz, da tua companhia, das nossas conversas, de rir diparatamente no meio da rua e de corrermos para casa onde os abraços eram ainda mais profundos e encaixavam na perfeição... de tudo o que fizemos a quatro mãos. E foi muita coisa.
Mas aquela paixão que nos ligou por mais de um ano foi obsessiva, controladora, doentia... e eu estava a deixar de respirar... e eu fui-me libertando, atabalhoadamente. como soube e consegui. E sei que aí te magoei. Fizeste-me mal e eu estava a morrer aos poucos. Perdi o sorriso e o brilho nos olhos, mesmo quando estavas ao meu lado. Fiz coisas que sempre condenei e nunca sonhei que poderia fazer... e, principalmente, permiti que me maltratasses.
Como é que ainda tenho saudades de algumas coisas? Não sei, talvez um dia perceba isso. Como é que ainda consigo pensar em ti com carinho? Não faço ideia e nem tento perceber.
Percebo sim que aquela paixão... que era suposto ter-se transformado no amor de uma vida... passou a obsessão, a maus tratos (porque a violência não é só física). E eu amei... tanto e tão sózinha. Até perceber que sempre tive razão, que de amor só se morre mesmo nos livros do Camilo Castelo Branco. Amei até se tornar em mim consciente que estava a amar sózinha... e que não queria isso... e que mereço mais e melhor. E que não tenho perfil para ser maltratada, em silêncio e com vergonha.
Mas custa muito admitir, principalmente quando se rebenta com o Mundo por um amor que depois não o é.
Poderia desfiar aqui um rol de dores, uma lista de desonestidades e acusações. Mas não quero. Isso é mesquinho demais para o tamanho do amor que te dediquei e em nada apaga o que passei. Neste momento só me ocorre pensar que ainda bem que já não estás na minha vida.
E passado mais de um ano, em que o tempo realmente não consegue apagar tudo, voltei a sorrir, voltei a reencontrar-me... talvez um dia também volte a acreditar.

Fica bem,
Maria

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Quero as janelas abertas

"Quero janelas abertas e o sol a entrar...", canta a Mafalda na rádio. E Cecília canta com ela. E os miúdos riem à gargalhada. E as pessoas dos carros ao lado olham perplexas, com um ar infeliz, enquanto aqueles três seres se abanam ao sabor e ao saber daquela música.
E Cecília sabe, naquele momento, que quer o seu mundo inteiro dentro do olhar deles... e que quer o mundo deles, todo, dentro dela.
E sabe que para chegar a este ponto virou o mundo do avesso, voltou a endireitar e a virar do avesso... vezes sem conta... até ver bem tudo o que queria.
E sabe que o vai fazer vezes sem conta pela vida fora, sempre que quiser, sempre que achar que precisa... mesmo que doa... muito.
Mas também sabe que por entre cada dor está escondido um sorriso... é tudo uma questão de virar do avesso e ver melhor!!! E deixar sentir... e deixar seguir...

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Desfragmentações

Maria sobe a rua,
Desce a rua,
Vira aqui, vira mais além, vira acolá.
E continua a subir.
Cruza-se com Maria... com Céu... com Jaime.
Cruza-se consigo e com outros.
Cruza-se no seu mundo e no mundo dos outros.
Maria sobe a rua,
Desce a rua.
Vira aqui, vira mais além, vira acolá.
E continua a subir.
Sobe e desce; sobe e desce; sobe, sobe...
Desfragmenta-se, reagrupa-se, vira-se do avesso e endireita-se numa roda vida moribunda.
Maria sobe a rua,
Desce a rua.
Vira aqui, vira mais além, vira acolá.
E continua a subir.
Os cheiros dos caminhos asslatam-na, entram-lhe nos poros e ela rejeita-os, empurra-os.
Quer os seus cheiros.
Quer ser livre de escolher os seus cheiros.
Maria sobe a rua,
Desce a rua.
Vira aqui, vira mais além, vira acolá.
E continua a subir.
E atira-se pela enconta de silvas.
E em cada arranhão, em cada rasgão, em cada gota do seu sangue, em cada dor sabe que está viva.
E quer estar viva... e mantem os 1001 sentido em alerta.
Maria sobe a rua,
Desce a rua.
Vira aqui, vira mais além, vira acolá.E continua a subir.
Sobe e desce; sobe e desce; sobe, sobe...

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Arroz Doce

Cecília abriu a porta das suas águas furtadas com o coração a bater dentro do peito e junto à palma da mão esquerda.
Por entre o escuro sentiu o cheiro a arroz doce quente, acabadinho de fazer. O arroz doce da avó São! E o frigorifico cheio de tudo aquilo que gosta. A mãe!
As duas presentiram o seu regresso. Cecília não anunciou datas. Recusou até a dizer quando estaria de volta. E elas souberam... sem palavras... sem gestos... sem sinais.
E acolheram Cecília de volta nos seus braços... entre sorrisos e almofadas. E Cecília sorriu com elas e para elas, enquanto comia uma taça de arroz doce quentinho já enterrada no seu pufe.
E não há outro arroz doce no mundo como aquele. E Cecília correu o mundo e os mundos. E só ali, nos braços da avó, reencontrou "aquele" arroz doce, que ela fazia sempre para ela.
Já com as janelas das águas furtadas escancaradas, Cecília deixou-se dormir ao som da chuva fininha que caía lá fora e do brilho de um arco-íris que lhe entrou pela janela.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Regressos

Helena... Lucinda... Madalena... Clarisse... Cecília... André... Júlio... Jaime... Partiram, de mochila às costas. Espalharam-se pelo Mundo, nos seus mundos. Absorveram outros mundos, que encaixaram no seu mundo, e regressaram.
Aprenderam, cresceram, receberam e deram.
Voltaram muito maiores, mas com a certeza de que ainda têm muito mais para engrandecer. Voltaram mais humildes... e logo maiores como pessoas.
Sete meses depois, nem mais nem menos, como tinham combinado sem necessitar de trocar palavras, regressaram àquele pontão com vista para o rio e lá ao fundo o mar.
Desta vez sem coca-colas e pastéis de Belém.
Desta vez com poeira entranhada no corpo e na alma.
Desta vez com sorrisos rasgados e a vontade inquebrantável de continuar a partilhar.
Desta vez com a alma renovada e o ímpeto de escancarar as janelas das suas águas furtadas.
Quem são Helena... Lucinda... Madalena... Clarisse... Cecília... André... Júlio... Jaime? São quem sempre foram.
Seres em evolução constante, seres com gosto pelo crescimento, seres com os olhos no futuro, pisando o presente e relembrando sempre o(s) passado(s).
Seres de luz que são um Ser.