quarta-feira, 20 de maio de 2009

Feridas

Basília... Que raio de nome lhe haviam de ter posto. Era o nome da parteira que a custo a obrigou a respirar e pumba... já estava escolhido o nome em homenagem à santinha.
Quantas vezes durante o seu, também ele doloroso, percurso escolar não ouviu, entre a gargalhada geral, perguntarem-lhe, em tom de afirmação, se os pais gostavam mesmo dela.
E Basília carregou consigo o peso de quem custou a nascer, de quem não queria abrir os olhos e respirar... e durante toda a vida levou este seu papel muito a sério.
E mais que ser ferida foi-se ferindo e culpando sempre os outros e o Mundo e os acasos desastrosos.
E há conta de um nome... Basília... não deixou entrar luz. Sempre que esta tentava assomar a uma porta ou a uma nesga de uma janela deixada entreaberta por acaso, Basília apressava-se a fechar tudo outra vez e a correr as pesadas cortinas que a envolviam.
E um dia, quem sabe se o mais feliz da sua existência, os olhos cederam aos cansaço e a respiração acabou por murchar.

"Todos estamos feridos. Mas uns estão mais feridos do que outros. São aqueles que se feriram a si próprios, sem disso darem conta", Baptista-Bastos, in "As bicicletas em Setembro"

1 comentário:

  1. O nosso pior inimigo somos nós próprios quando lutamos contra as luzes que surgem no fundo do tunel.

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