terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Querido Diário


Mais um dia daqueles digno de filme de humor… negro. OU de terror, nem seibem. Não houve nada que não me acontecesse. E tu sabes como sou, por norma, uma pessoa ao estilo “alto astral”. Mas uma tarde inteirinha na segurança social à espera de vez esfrangalha o sistema nervoso do ser mais zen.

Durante aquelas intermináveis horas senti cada segundo que passou, com os sons e odores que volatilizavam por ali. Fragmentos de conversas invariavelmente tristes. Cheiro a cansaço de exército que depôs as armas (e de alguma transpiração e falta de banho também).

Fiquei a saber que os dois filhos da senhora gorda que se sentou ao meu lado com a amiga deram o salto para o estrangeiro e como ela sente a falta dos netos. Assisti a uma pequena conferência dedicado ao tema “alimentação saudável e ginásio” e outra sobre “como sustentar uma família quando estão os dois desempregados e os 4 filhos continuam a comer, a vestir e a ir à escola”.

Aprendi muito sobre as novas oportunidades no mundo do faça vocês mesmo. Aí acho que dormitei um pouco. Sempre ajudou a passar uns 20 minutinhos.

Pelo meio duas cenas de gritaria, entre a ofensa à mãe dos senhores do governo e o choro de desespero por não se saber o dia de amanhã.

Pois é, querido diário. Ninguém pode ficar indiferente a uma tarde naquele espaço mofado e bolorento, tomado de assalto por uma tropa de infelizes.

Mas, finalmente casa. Ansiava pelo banho quente (que ainda me posso dar ao luxo de tomar). Por esses minutos tentaria esquecer todas aquelas dores que se me entranharam no corpo e na alma.

Mas… espanto dos espanto. Primeiros sinais da catástrofe – a casa tinha outro cheiro, o cheiro da minha mãe, e uns passos à frente, na mesa de entrada, um bilhetinho dela. Estremeci: “passei por cá hoje filha!!! Estavas mesmo a precisar. Um beijo grande, Mãe”. Entrei bem devagar na sala onde tenho a minha, muito minha, mesa de trabalho. Em passo lento tentei reter o momento e conter a irritação que me começava a invadir. Um nó na garganta, bem pequenino, que se agiganta… e vejo aquilo que já sabia: a minha secretária estava irremediavelmente arrumada.

E agora? Entre a irritação e o pânico começo à procura dos meus papeis. Aqueles que conhecia de cor a posição no meio da sua desarrumação sempre muito organizada.

Sentei-me para deixar que o ar entrasse e me acalmasse com os cotovelos poisados na secretária, as mãos entre a cabeça e os olhos fechados. Aquela arrumação iria obrigar-me a horas infindas para descobrir as minhas coisas e as voltar a pôr nos seus lugares por direito.

De repente levanto os olhos e fecho-te a ti, meu querido Diário, mesmo no topo de um montinho de papéis, em destaque, parecias ter um brilho tão diferente, que nem sabia como explicar. E aí percebi. Tu viste tudo!!!

1 comentário:

  1. Há muito tempo que não passava por aqui hoje resolvi ler o pouquinho que partilhaste connosco do teu diário. Beijinhos

    ResponderEliminar